quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Um modo de falar


Antônio sempre gostou de conversar, de contar histórias, falar do seu dia-a-dia. Um homem simples e ingênuo no seu vocabulário.

Getúlio, um de seus filhos, também gosta de uma boa conversa. E quando se trata de falar pai e filho tem algo peculiar.

Enquanto Getúlio caminha pelo mundo das gírias, o pai, Antônio, tem o hábito de tornar suas palavras e frases engraçadas e desajeitadas. Há pessoas que respeitam, outros debocham, mas a ingenuidade de Antônio nunca lhe permite notar nem uma coisa nem outra.

Getúlio chega ao trabalho e encontra o amigo Osvaldo que acabara de perder a mãe. Ele diz:

- Po bicho, saí do trampo e cheguei na baia pra rangar e minha coroa disse que a tua velha tinha batido as botas. Fiquei de cara meu.

Osvaldo completa:

- Pior que é cara.

Antônio sai do trabalho e monta em sua bicicleta. Ele começa a pedalar e logo pega muita velocidade. 

Minutos depois aparece na barbearia do Valmir todo machucado e com a bike toda torta.

Ele diz ao amigo barbeiro:

- O Valmir, tu não vai acreditar. Eu não vinha correndo com a minha bicicleta, não escorreguei no areão aqui na frente, não caí e não me ralei todo, e ainda não quebrei minha bicicleta.

Valmir, muito debochado, diz a Antônio:

- Que bom rapaz. Que bom que não vou acreditar. Que bom que você não vinha correndo, que não escorregou no areão aqui na frente, que não caiu. Não se ralou e não quebrou a bicicleta.

Antônio em toda sua inocência tenta explicar ao barbeiro:

- Não. Tu não entendeu Valmir. Aconteceu tudo que tu falou, só que ao contrário.

Enquanto Antônio toma um copo de água na barbearia comenta a morte da mãe do Osvaldo.

- Coitadinha da dona Flora, mãe do Osvaldo. Quando acordou estava morta.

O barbeiro Valmir, sempre debochando, diz a Antônio:

- Acordou morta, Antônio?

- É isso mesmo, Valmir. Já pensou que loucura, que susto. Acordar e vê que ta morto?

 Antônio continua sua narrativa sobre a morte da mãe de Osvaldo:

- A pobrezinha morreu na sexta-feira e se enterrou no sábado.

Novamente o barbeiro com seu sarcasmo provoca Antônio sem que ele perceba:

- Poxa, ela se enterrou? Não havia ninguém para enterrá-la?

Antônio responde:

- Agora tu me pegou, rapaz. Foi o que ouvi. Mas parece tinha bastante gente no enterro.

O barbeiro pergunta a Antônio:

- Estás morando aqui perto?

- To sim. Não tem essa rua que asfaltaram agora. Não tem o posto de saúde. Não tem um mercadinho ali na esquina. Então, eu moro do lado.

O barbeiro termina de atender um cliente e diz a Antônio:

- E aí Antônio, vai cortar o teu cabelo?

Antônio sem perceber dá a resposta que Valmir não imaginava:


- Eu não sei cortar cabelo, Valmir. Ainda que do teu jeito prefiro que tu corte pra mim!

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