Bruno sempre fora elogiado por sua boa memória, muito embora
ela falhasse em assuntos recentes.
Uma boa memória é importante em especial
para um jornalista em meio a inúmeras matérias e trabalhos.
Certo dia, Bruno recebeu sua pauta e achou mais do que
interessante. Deveria viajar até Porto União em Santa Catarina para entrevistar
um velho índio. O chefe de Bruno explicou que escolheram aquela pauta devido a
temas sobre: Boa memória, e aquele índio, segundo o que se dizia, tinha uma
memória incrível.
Bruno entra em seu fusca e viaja até Porto União. Assim que
estaciona o carro passa a apreciar a bela cidadezinha com ar de interior e a
costumeira calmaria.
Depois de caminhar alguns minutos pergunta a um homem na
praça se conhece certo índio de boa memória. Para sua surpresa e facilidade o
homem aponta para um índio sentado em um pequeno banco de pedra. Bruno leva a
mão até o bolso da camisa com a intenção de pegar o bloco de anotações. Nota
que havia o esquecido no carro. Assim que volta e abre o fusca vê o bloco no
banco do carona e também seu gravador, do qual havia esquecido as pilhas novas
no jornal.
Com o bloco nas mãos ele se aproxima do índio e começa a
avalia-lo. Parece ter uns cinquenta e poucos anos, pele e aparência facial de
um índio que vivia sem os cuidados da cidade, mas com a força e semblante de
paz de quem vive exclusivamente em meio à natureza.
O jornalista atencioso abre seu bloco de notas e inicia
breves lembretes sobre aquela situação.
Coloca a data: 25 de maio de 1985. Ele chega perto do índio,
apresenta-se e pergunta sem avisar o motivo principal da entrevista; queria
começar a matéria de maneira especial e testar a tal boa memória do índio.
Bruno pergunta:
- O que o senhor comeu na manhã de 07 de junho de 1950?
- Ovos!
A resposta rápida, sem nem sequer um instante para pensar,
ou um olhar para o alto a fim de buscar suas memórias. Simplesmente incrível. A
conversa seguiu e surpreendeu muito a Bruno.
A matéria publicada no jornal em qual trabalhava no dia 28
de maio de 1985 fora muito elogiada.
O tempo passou rápido. Bruno já estava aposentado, mas
continuava trabalhando. Aos 62 anos de idade nem pensava em deixar o
jornalismo.
Em suas férias no mês de maio de 2015 ele viaja com esposa
com a intenção de conhecer novos lugares, outras cidades. Chegam a Porto União,
perto da divisa com o Paraná. Começa a caminhar com a esposa, Aline. Ela vê
certa loja de artesanatos e diz ao marido que vai olhar mais de perto aquelas
belas obras. Bruno sente algo estranho e diz à esposa que quer seguir em frente
em sua caminhada. Explica que tem uma estranha sensação. Era como se já tivesse
passado por essa cidade, mas não tem certeza de quando e por quê.
Ele pensa: Será que era uma namorada? Vim comprar um carro?
Quem sabe alguma festa? Ou talvez alguma matéria para o jornal, mas sobre o
quê?
De repente, ele olha adiante e vê sentado na praça, num
pequeno banco de pedra, um velho índio.
Agora as coisas começavam a fazer
sentido. O velho índio, a praça, seu fusca; um índio com uma incrível memória.
Devia fazer pelo menos 30 anos que estivera ali. Ele caminha lentamente em
direção ao velho índio enquanto retornam seus pensamentos, sua lembranças, suas
memórias.
Fica surpreso em ver o índio ainda vivo. Perplexo caminha em
direção ao senhor. E dessa vez de férias, sem blocos de notas e sem os modernos
aparelhos de comunicação. Bruno se abaixa em frente ao índio velho e pergunta
ainda um tanto confuso:
- Mas como?
O índio velho, sem pensar, sem titubear, sem recorrer a
olhar para cima em busca de respostas diz a Bruno imediatamente:
- Fritos!