quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Revolta da chibata


No dia 22 de novembro de 1910 uma rebelião que envolveu 2.400 marinheiros assustou o então presidente Hermes da Fonseca.

O líder do movimento, João Cândido Felisberto, o célebre almirante negro.

A ameaça; bombardear a cidade do Rio de Janeiro, na época capital do Brasil.

O motivo; as péssimas condições de trabalho dos marinheiros. Por péssimas condições, entenda-se: baixos salários, má alimentação e castigos físicos, entre eles o uso da chibata.

A proclamação da República ocorreu no dia 15 de novembro de 1889. No dia seguinte, o então presidente, marechal Deodoro da Fonseca, por decreto, havia colocado fim aos castigos, as chicotadas.

Na prática isso não aconteceu. No final do século XIX e início do século XX tanto a polícia bem como pais enviavam a Marinha pessoas ou filhos rebeldes.

Normalmente por erros médios os marinheiros eram castigados com 25 chicotadas.

Certo dia o marinheiro, Marcelino Rodrigues tentou entrar no navio com duas garrafas de cachaça. 

Ao ser repreendido por um superior iniciou-se uma briga onde Marcelino feriu o colega com uma navalha. A punição surpreendeu até os marinheiros que já estavam “acostumados” aos castigos. 

Marcelino Rodrigues foi chicoteado diante os colegas de maneira especial, levou 250 chicotadas. O iodo era a única ajuda medicinal que recebiam os que eram chicoteados.

Acontece então a Revolta da Chibata. Uma insurreição, um levante de cunho social por subdivisões da Marinha do Rio de Janeiro.

Na época a Marinha era composta por 50% de negros, 30% mulatos, 10% caboclos e 10% brancos.

O levante durou de 22 a 27 de novembro de 1910. O presidente Hermes da Fonseca notou que não era blefe. De fato, morreram alguns marinheiros e também 5 oficiais.

Depois de muitos maus tratos, as 250 chicotadas como punição ao marinheiro Marcelino Rodrigues levou a preparação desse motim.

Hoje notamos similaridades lamentáveis.

Maria da Penha. Uma Lei criada após uma mulher sofrer agressões por mais de 20 anos, entre elas um tiro que a deixou paraplégica.

A violência contra a mulher continua. Assim como contra crianças e idosos. Sem esquecer as vitimas dos criminosos do trânsito.

Opa, a crônica/coluna não incentiva a rebelião. Rebeliões costumam ferir e matar, inclusive inocentes. A educação, a consciência, a humanidade, a empatia e o respeito tem tudo para levar a comportamentos que jamais necessitam de rebeliões.

Há poucos dias conversei com uma mulher que admitiu apanhar do marido há 40 anos. Surras, humilhações e ameaças de morte. No exato momento em que a encontrei ela estava de saída para fazer uma denúncia. Já havia feito várias. Disse que havia sido muito bem atendida pelos policiais. 
Mas nada havia mudado dentro de casa. Em nossa conversa que durou mais de uma hora e por alguns instantes fora observada pelo marido, a mulher mostrou um roxo em seu braço esquerdo e partes da roupa rasgada. Quando mostrou o ferimento no braço, disse:

“Isso não é nada, já estou acostumada”. Disse que o marido fora muito cruel com seu filho mais velho. Ela contou que certo dia sua filha disse: “A mãe tem o que merece, parece até que gosta”. A mãe deu um tapa no rosto da filha. Parece que a filha só queria dizer a mãe: “Poxa mãe, como à senhora aguenta, a senhora não merece isso, já dura muitos anos, ponha um fim nessa história, o deixe”. Essa foi minha leitura das palavras da filha.

A senhora agredida por 40 anos disse que até suas irmãs sempre a incentivaram a continuar com o marido. Diziam que ele é um bom marido e merecia seu perdão e compreensão. Uma mulher agredida ouvir isso das próprias irmãs sugere algo terrível em nossa sociedade. Machismo, tolerância exagerada ou o quê?

Não sei se dia 22 de novembro haverá lembranças da Revolta da Chibata. Talvez haja, quem sabe com outras lições. Boa leitura é aquela em que aprendemos a ler nas entrelinhas. Nos faz crescer, amadurecer. Entender que o leitor não é e não deve ser passivo.

A chibata aplicada aos marinheiros. A violência contra a mulher que levou a criação da Lei Maria da 

Penha. A violência do trânsito comprovando que não há destino, que não existe o – era para ser assim, era para acontecer.

E atenção moças que estão namorando: Ele te feriu fisicamente, verbalmente, segurou firme pelo braço demonstrando que ele pensa ser teu dono, usa drogas ou abuso do álcool e não demonstra esforços em melhorar? Cai fora. Parte pra outra. Não faltará um homem de verdade para te fazer feliz.

Nenhum de nós precisa esperar para fazer uma revolta, nunca acaba bem para ninguém.

Revolta é contra ideias e crenças que tentam enfiar em nossa cabeça. Revolta é contra ler com pouca atenção. Não ir atrás “das massas e das mídias de grandes massas” que por inúmeros motivos e por vezes não apresentam todos os fatos ou são tendenciosos.

Podemos trocar revoltas e motins por educação, estudos, imparcialidade e muito respeito.

O almirante negro, João Cândido faleceu em 6 de dezembro de 1969. Viveu o bastante para presenciar as duas principais “revoluções” do Brasil. Em 1930 e em 1964.

A chibata literal até ficou no passado, mas a “chibata” continua castigando mulheres, crianças, idosos e vítimas dos criminosos do volante.


Mas nós podemos fazer a nossa parte, e sabemos como! 

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