quarta-feira, 19 de setembro de 2012

O folgado do Ipiranga

Raimundo era folgado e assunto encerrado. Em casa mal chegava e as ordens já passava. “Baixem o volume desse rádio”, mas se o assunto o interessava, “aumentem já esse volume”. “Tirem já o lixo”. “Por que ainda tem louça na pia?” “Raimundinho me traga um copo de água, e gelada”. “Alguém me alcance uma toalha de banho, e rápido”. Raimundo pedia tudo para todo mundo, o bairro Ipiranga inteiro sabia disso. Se fosse um rei de verdade até faria algumas coisas sozinho, mas não o Raimundo. A mania de dar ordens e querer que se fizessem as coisas a sua maneira era levada até as ruas, até com desconhecidos. Pedia favores a qualquer um. Se é que alguém havia lhe apresentado um tal de “por favor”, ele havia esquecido. Certo dia Raimundo agrediu um vizinho por conta de brigas entre seus cachorros. O vizinho foi fazer um BO. A denúncia era grave, tinha até testemunhas. Raimundo olhou para um menino na rua e disse para ele ver se o tal vizinho não queria que lhe chamassem um táxi, disse que sangrando e nervoso daquele jeito um ônibus não seria boa ideia. Raimundo entrou no bar do seu Peruca. Era sábado pelo meio da manhã. Dia quente e bonito. Raimundo pediu uma cerveja bem gelada e começou aquela conversa de sempre que parece ter um rumo, mas não leva a lugar nenhum. Avaí sobe, Figueira desce, Criciúma e Joinville vão mesmo ou morrem na praia. Seu Peruca sabia que Raimundo preferia que alguém o servisse, então abriu a garrafa e começou a encher seu copo. Raimundo via a espuma branca subindo e o copo já transbordando. Sentia a boca seca tanto pelo calor bem como pela discussão acalorada com o vizinho. Assim que pegou o copo e ameaçou levá-lo a boca ouviu alguém dizer: - Quem é seu Raimundo? Quem perguntou foi um policial. Raimundo tomou o primeiro gole e disse: - Sou eu! Por quê? - O senhor está preso! Tem de nos acompanhar. Com o copo na mão Raimundo respondeu: - “Pera aí, pera aí”. Eu vou sim, mas primeiro vou acabar minha gelada. Trabalhei a semana inteira e to cansado. Eu vou numa boa, mas “pera” aí. Os policiais trocaram um olhar em que pareciam em dúvida. Ou esperavam ou arrumavam uma baita confusão com aquele sujeito dentro do bar. Raimundo tomou toda a cerveja e passou a mão na boca. Olhou para os policias e disse: - Vão pegando as algemas. Amarrem pela frente que é melhor pra sentar e passar a mão no rosto. Depois de algemado o conduziram até a viatura em frente ao bar. Abriram a porta e Raimundo entrou. Quando os policiais entraram e se acomodaram, Raimundo disse em alto e bom tom: - Toca pra delegacia!

Um comentário:

  1. Parabéns por suas crônicas, Deivison. Continue firme no teu propósito. Abraços

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