segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Nem morto

João Carlos estava em dúvida – ou não estava ouvindo bem, ou tinha mais gente louca no mundo do que ele imaginava, e ele estava incluído nessa lista. Na empresa onde trabalhava fora surpreendido por seu pai que estava de saída e lhe pediu um difícil favor: - Ah, João Carlos, avise o Raimundo que a mãe dele morreu. João Carlos ficou perplexo. “Como dar uma notícia dessas? Por que meu pai não dá a notícia? Por que eu?” Resmungava João Carlos. Faltava uma hora para Raimundo voltar à empresa e deixar a maleta de ferramentas, era mecânico de elevadores. João Carlos não sabia como dar a tal notícia. Raimundo chegou cantando. João Carlos o cumprimentou e o seguiu até a sala dos mecânicos. Encheu-se de coragem e disse: - Raimundo. Tenho uma notícia nada boa. Tua mãe faleceu. Eu sinto muito. Raimundo, um homem de quase 50 anos e barrigudo começou a chorar. João Carlos chorava ao seu lado. No dia seguinte, assim que João chegou à empresa, perguntou por Raimundo. Disseram que ele já estava em algum prédio dando manutenção a elevadores. - Mas, e o velório da mãe dele? – Perguntou João Carlos. - Do que está falando, rapaz? – Perguntou o sócio de seu pai. A mãe de Raimundo não estava morta. Pelo menos não ainda. Seu pai entendera mal ao telefone. No telefone disseram que ela havia piorado muito e seu pai entendeu que ela havia morrido. O dia de João Carlos foi angustiante. Como encarar Raimundo no final do dia quando se encontrassem? O que dizer? No início da tarde a notícia foi certa. A mãe de Raimundo agora sim havia falecido. O sócio do pai de João Carlos deu a notícia a Raimundo. No dia anterior o pobre Raimundo havia chorado a morte de sua mãe e quando chegou ao hospital aos prantos seus irmãos não entenderam nada. Agora Raimundo tinha uma ponta de esperança de que poderia ser engano. Afinal de contas, aquele maluco do João havia se enganado no dia anterior. “Quem sabe hoje também seja alarme falso”, pensou Raimundo. Não era. Quando chegou calmo ao hospital os irmãos estavam aos prantos. Não entendiam a calma de Raimundo. Dois dias depois João Carlos e Raimundo se encontraram na empresa. João Carlos não tivera coragem de ir ao enterro. Não queria encontrar Raimundo. Agora estavam frente a frente. Raimundo olhou bem nos olhos de João Carlos e disse: - Lembra outro dia quando você disse que minha mãe tinha morrido? Ela estava viva. João falou: - Eu sei. Sinto muito pelo que disse e pela morte da tua mãe – Raimundo saiu sem dizer mais nada. João Carlos pensou que houve um lado bom dessa história. Raimundo acabou indo ao hospital aquela noite e teve a oportunidade de ver a mãe viva uma última vez. Claro que jamais diria isso a Raimundo. Pouco tempo depois disseram a João Carlos que o Manoel, um conhecido, havia morrido. João Carlos deu a notícia para algumas pessoas. Dias depois encontrou o mesmo Manoel quase em frente sua casa, mais vivo do que nunca. João Carlos torceu para que Manoel não ficasse sabendo que ele espalhara a notícia de sua morte que não acontecera, pelo menos não ainda. Outro dia disseram a João Carlos que seu Amaral havia morrido. Ele foi ao cemitério e entrou na casa mortuária. Lá estava seu Amaral, rodeado de amigos em lamento. João Carlos chegou perto da viúva para dar os pêsames, mas resolveu esperar o enterro. Só para ter certeza.

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